O deputado estadual Thiago Silva (MDB), de Mato Grosso, decidiu processar o jornalista Arthur Garcia, que é conhecido por suas investigações incisivas e reveladoras, por ter realizado uma denúncia no ano de 2022, onde o deputado utilizou do avião exclusivo da Assembleia Legislativa para dar carona aos seus amigos, Daniel e Samuel que são cantores gospel. A reportagem apresentou fotos e vídeos mostrando os cantores descendo do avião em duas cidades que realizaria seus shows. A ação legal do deputado era com pedido de indenização por dano moral e direito de imagem no valor de R$ 45.000,00 e foi motivada pela reportagem que Arthur Garcia publicou, a qual expôs um fato de interesse público, levantando questões sobre a ética e a legalidade do uso de recursos públicos para fins pessoais.
A matéria de Arthur Garcia detalhou como o deputado teria favorecido interesses privados ao promover shows e eventos, utilizando bens públicos. A reportagem despertou a atenção da população e gerou um debate acalorado nas redes sociais, com muitos cidadãos questionando a integridade do representante e a transparência na administração pública.
Em resposta ao processo, Arthur Garcia defendeu seu trabalho como um exercício do direito à informação e à liberdade de imprensa, afirmando que a função do jornalista é expor a verdade e fiscalizar os atos de autoridades. O caso rapidamente ganhou repercussão na mídia, com especialistas em direito e ética pública analisando as implicações legais do uso de aeronaves oficiais para compromissos pessoais.
Além disso, a situação trouxe à tona questões mais amplas sobre a responsabilidade dos políticos e a necessidade de uma fiscalização mais rigorosa sobre o uso de recursos públicos. A população, atenta ao desenrolar do caso, clama por transparência e integridade nas ações de seus representantes.
O que diz a decisão?
Conquanto a parte autora afirme que os vídeos e textos da
matéria jornalística são dotadas de caráter difamatório e calunioso, verifico que todas
os links citados no id. 136159036, pag. 32 e 33 referem-se a matéria jornalística de
caráter investigativo.
Inicialmente destaco que a liberdade de imprensa é assegurada
pelo conjunto de cláusulas pétreas previstas nos artigos 5o, incisos IV, XIII e XIV, e no
art. 220, todos da Constituição Federal.
A propósito, o §1o, do art. 220, da Constituição Federal dispõe
que:
Art. 220. (…)
§1o Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir
embaraço à plena liberdade de informação jornalística em
qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no
art. 5o, IV, V, X, XIII e XIV.
In casu, a matéria jornalística produzida pelo primeiro
reclamado demonstra possuir nítido caráter investigativo e discorre sobre os elementos
formadores das informações jornalística.
Destaco que a imprensa deve respeitar à intimidade, a honra e
todos os demais direito da personalidade das pessoas. Ocorre, entretanto, que o
jornalismo investigativo tem o dever de noticiar fatos que são verdadeiros ou que, ao
tempo da apuração, aparentavam-se segundo provas ou informações com alto grau de
verossimilhança.
Nesse sentido, conquanto a imprensa deva responder pelos
danos causados por eventuais atos ilícitos praticados, a regra geral do estado
democrático de direito é que a imprensa não seja censurada por matérias ou
investigações.
Como a matéria investigativa impugnada pelo reclamante está
assentada em investigação com elementos de prova que demonstram a ocorrência do
fato, não é possível se falar em difamação.
Além disso, ao reclamante foi oportunizado explicar o motivo de
constar o nome dos cantores gospel na ficha de embarque do avião, de modo que a
matéria jornalístico-investigativa demonstrou seu caráter investigativo, baseado em
fatos e provas apuradas pelo primeiro reclamado.
Ressalto ainda que competia à parte autora provar o fato
constitutivo do seu direito, à luz do art. 373, I, do Código de Processo Civil,
especialmente para demonstrar que os fatos narrados nas matérias não condiziam
com os eventos efetivamente ocorridos.
Destaco que, conquanto o Parecer de id. 136160945 esclareça
que não é dever do deputado fiscalizar os passageiros do voo, a matéria investigou e
noticiou um fato que se reveste, segundo as provas dos autos, de alto teor de
verossimilhança, dado que os cantores viajaram junto com o reclamante, segundo a
ficha de embarque[1].
Com efeito, a responsabilidade civil decorrente de matérias
jornalísticas decorre da existência de ato ilícito, nexo causal e dano à vítima da ofensa.
Acontece, entretanto, que o autor não demonstrou nenhum dos
elementos da responsabilidade civil, dado que os fatos citados na matéria gozam de
alto grau de verossimilhança e o reclamante é Deputado Estadual, de modo que está,
pela própria natureza e relevância do cargo que ocupa, muito mais suscetível a
investigações sobre suas rotinas públicas e privadas.
Por fim, lembro que a Lei no. 13.188/2015 dispõe que:
Art. 2o Ao ofendido em matéria divulgada, publicada ou
transmitida por veículo de comunicação social é assegurado o
direito de resposta ou retificação, gratuito e proporcional ao agravo.
O prazo do direito de resposta ou retificação é de 60 dias
contados da divulgação de cada publicação, consoante art. 3o, da Lei n. 13.188/2015.
Conquanto o reclamante tenha recebido informações da
Procuradoria da ALMT, no sentido de que não compete aos deputados “fiscalizar e
impedir embarque de outrem autorizado pela empresa contratada”, não verifiquei
pedido de resposta ou retificação da matéria no prazo legal.
Assim sendo, inexistindo prova de que a matéria jornalístico-
investigativa versa sobre fatos inverídicos, difamatórios ou caluniosos, não há que se
falar em responsabilidade civil, muito menos em censurar a liberdade de imprensa e
informação dos reclamados.
Diante do exposto, proponho, com fulcro no art. 487, I, do
CPC, JULGAR IMPROCEDENTES os pedidos formulados.
João Celestino Batista Neto
Juiz Leigo